quinta-feira, 16 de fevereiro de 2023

Revendo Histórias

♫ Suicide Blonde... Suicide Blonde...

♫ Kátia Flávia é uma louraça Belzebu / Provocante

Uma louraça Lucifer / Gostosona

Uma louraça Satanás / Gostosona e provocante...

Alô, Alô Polícia!

♪Meu nome é Kátia Flávia / A godiva do Irajá

Me escondi aqui em Copa... Polícia!! ♫

Ah, Anos 80! Império do Rock Nacional, do gel gumex e das Calças Saint-Tropei...to.

Todos ligados no som do RPM, grupo de Rock que agitou os costumes da época. RPM era um trocadilho que indicava a abreviação de REVOLUÇÕES POR MINUTO, mas depois que seu crooner foi pego pela polícia com uns Beck na bagagem, passou a ser chamado de RPM - Ricardo Puxador de Maconha.

Paulo Ricardo incendiou o Brasil com Loiras Geladas e tantos outros sucessos. Novo símbolo sexual, tabaréus do Brasil inteiro queriam ser Paulo Ricardo, por quem as mulheres deliravam. Paulo Ricardo reinventou o penteado Pigmalião 70 e ajudou os magrelos a se exibirem em camisetas cavadas sem quaisquer constrangimentos.

Foi aí que o Cassino do Chacrinha mostrou o Paulo Ricardo nas telas das Philcos e Telefunkens. Bastou isso para todo varão querer deixar o cabelo crescer, rente cortar as costeletas, pepinar o topete e deixar um rabo de cavalo volumoso. Pouco tempo depois estavam Paulo, Jonas, João, Salvador, Galego, Lió e todos os barbeiros de Riachão cortando cabelo de homem, mulher e viado a la PR. Enfim, o século 20 aportou na Terra das Algarobas!

Evidente que eu não me enquadrava nesse atraso comportamental, desde muito já usava um cabelinho repicado e no bolso um tubo de Gel New Wave (última moda em Paris), portanto, quando chegava da capital o layout já não causava estranheza, mas o que se via de “orêa seca” ostentando uma bela juba ninguém dava conta.

Em 1987, o maior sucesso das paradas era a inusitada Kátia Flávia, do não menos inusitado Fausto Fawcett, um porra-louca morador de Copacabana que fez essa música em ritmo de Funky Music, desbancando os bambambãs do Rock Nacional. Que Paulo Ricardo que nada, que Legião que nada, que Paralamas que nada, que Titãs que nada. Todos cantávamos as Calcinhas Exocet, as Calcinhas Antiaérea, as Calcinhas Framboesas usadas pela Louraça Belzebu que desafiava a polícia andando nua em seu cavalo branco pelas ruas da Cidade Maravilhosa.

__ Tan tan tan tan tan tan... Alô Puliça!! Eu tô usando, uma “Esso sé”

__ Aiiii, minha música! Adoro. Será que vai tocar no Preto e Branco esse ano?

__ Menina! Mas eu já procurei essa calcinha “esso sé”. Até na Feira do Tecidos eu fui e não encontrei.

__ Mintchura! Também tô louca para ter uma, eu já encontrei até um macacão da Esso, mas tá é difícil comprar a tal calcinha da Katia Flávia.

__ Na Mesbla Vende! – Chutou a tabaroa..

__ Na Mesbla não vende né Moto?

__ Como tu é ignorante! Lá vende de tudo, se Deus quiser em compro uma para o baile do Preto e Branco.

E não é que naquele ano o Preto e Branco botou pra quebrar!!! Contrataram a banda Joedson, de Ipiaú, famosa pela qualidade do som e inédita na região.

__ Chocante! Tio Lio botou pra lá!!!

__ Que foi, Abriu uma filial da Plury Modas no Iguatemi?

__ Não, melhor ainda, contratou a banda Joedson para tocar no Preto e Branco, uma banda Internacional, que tem até sintetizador.

__ Arrasou!! Mas o que é sintetizador?

__ Não sei... mas eles têm um novinho, me disseram.

__ De onde é essa banda?

__ Do estrangeiro, dizem que vem de navio, lá do Piauí...

__ E Piauí é estrangeiro?

__ Claro, terra de Julio Iglésias.

__ Deixa de ser Burro, Julio Iglésias é do Maranhão, cala tua boca.

(Diálogos prováveis)

O Joedson era realmente uma excelente banda, tocava muito no sul da Bahia e na região metropolitana, e de fato, nunca tinha vindo a Riachão. Deram um show! O Baixista era sensacional, e sim, já tocavam Kátia Flávia, o que garantia os comentários elogiosos no pós-piseiro.

Existia em Riachão uma certa Matriarca, simpática vovozinha, que reunia em torno dela anualmente toda a família. Parentes vinham de todos os cantos para confraternizar com a Nonna e aproveitar o burburinho Jacuipense. Contam que tempos atrás ela presenciou uma briga generalizada no clube da cidade, traumatizou-se e jurou nunca mais ir a festa em Clube, morria de medo, alegava que era muito violento, só dava brigas e encerrava o assunto.

Naquele ano a filharada, a netaiada e afins, resolveram leva-la para o Baile do Preto e Branco. Ela relutou, negou-se a principio, mas, dado o clima em família de festa e felicidade geral, finalmente concordou em ir. Logo depois da meia noite, desceram todos para a Festa sob o comando do famoso Grupo Joedson.

Pelas ruas de Riachão já se via um elegante desfile de longos vestidos pretos, trajes Brancos reluzentes, combinações de todas as formas, até chapéus emplumados. Ali se reconhecia roupas remodeladas, outras debutantes, algumas traziam gravadas a própria história da festa, já que presenciaram todas as edições. Tinha de tudo. No final toda elegância se rendia a hits com versos do tipo: “Comprei uma panela de pressão... só pra ver se cozinho mais depressa...” Como dizia o Lobão em apropriado Hit da época: “Decadence avec Elegance”.

Na Rua Nova, endereço do Clube Lira 8 de Setembro, sentia-se o alto astral já pelas imediações do Bar Chapéu de Couro, sempre repleto (4 mesas disputadíssimas). Carros estacionados por toda a parte e uma aglomeração incrível na frente da Lira 8.

Vovó seguia muito protegida entre tantos familiares, sempre motivada.

__ Estou com Medo!

__ Que nada Mamãe, lá dentro está tranquilo, compramos uma mesa na parte alta do clube, só tem essa fila mas é normal, a Senhora vai se divertir, e acabar com esse medo bobo.

Na entrada da Lira havia um terrível curral, a entrada era na base do empurra-empurra, um de cada vez, a demora era praxe, penetras e furões também faziam parte do protocolo. A fila já passava da casa de Periquito e dobrava a esquina da rua do Hospital.

Mas era tudo diversão, na fila já se tomava uns gorós, já se dançava ao som da banda o que aumentava a ansiedade de entrar logo na festa, e também ali já se paquerava. Vovó seguia protegida, incentivada e até decidida a curtir uma festa depois de tantos anos, afinal, seus queridos filhos e netos de várias gerações estavam todos presentes e felizes.

Segue a fila e Vovó já dava até uma reboladinha, batia o pezinho.

__ Vai tocar Ray Conniff? Perguntou inocentemente a um dos filhos.

__ Acho que não mamãe, mas a Sara Jane está com uma música linda.

__ Vó! Ademar da Banda Furta Cor está ai e vai tocar Ave Maria no fim da festa – Mandou essa lorota um pirralho que morria de medo da vó desistir e ele perder a farra.

__ Ah! Tá, eu vou gostar, realmente as festas mudaram, estou adorando tudo.

A festa começou às 11 horas, passava da meia-noite, o clube já estava lotado e lá fora tinha mais gente que dentro do salão. A fila continuava animada:

(♫ tan tan tan tan tan tan ♫);

Gritos de felicidade, a música do momento começou a tocar.

(♫ Kátia Flávia é uma louraça Belzebu / Provocante ♫)

Todos se sacolejando na fila. O baile ferveu!

__ Bora com essa fila, minha música está tocando!

__ É pique, é pique... (povão em coro)

__ Urra!! Urra! Empurra, empurra!! (respondiam em bloco os que já venceram as grades da Lira 😎

( ♫Uma louraça Lucifer / Gostosona♫ - A banda seguia tocando a música do momento)

__ Vó, já estamos passando na catraca, a mesa é logo na entrada, curte o som, tá todo mundo feliz – Meio preocupado estava o neto com as novas feições da Nonna.

(♫ Uma louraça Satanás / Gostosona e provocante... ♫)

Vovó começou a prestar atenção na letra da musica e fez o sinal da cruz.

(♫ Alô,Alô Polícia! Polícia pode vir.. ♫)

__ Quero voltar pra casa agora – bradou categoricamente a vovó

__ Mas vó, agora é a nossa vez de entrar.

__ Esse inferno só tem briga. Nem bem entrei e já chamaram a Polícia. Todo mundo para casa, quem não me atender excluo do testamento. – sentenciou a Matriarca. Katia Flávia acabou a festa da família....

Por Roque Oliveira ( Jcuipense, 57 anos, advogado, pai de Breno, Cmila e Marina)

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