Ouço dizer que o governo do Estado
pretende fazer um túnel sob a avenida do contorno, como alternativa de acesso
ao conjunto viveiros. E aí fico seriamente tentado a mover uma ação popular
contra tal obra. Afinal, sou feirense, amo a minha cidade, conheço bem aquela
área, e sei que ali estão exemplares ímpares da nossa fauna e flora
catingueira, que serão extintos ou prejudicados pela obra. São arbustos
centenários e pequenos animais que só são encontrados naquele ecossistema. Caçutingas,
juremas, velaminhos, mandacarus, cabeças de frade, milome, pau de rato, cujas
folhas e frutos são largamente utilizados pela indústria etílica da “folha
podre”, com larga aceitação entre a população nativa. É cultural. Existe até
literatura de cordel tratando do tema, como o livro do poeta Franklin Machado
(Maxado Nordestino) A farmácia de folhas do Dr. Cumpadinho, alusivo ao boteco
quase centenário, situado no Beco do Mocó, especializado em infusões de ervas e
folhas na cachaça.
Há ainda os raríssimos exemplares da
fauna, como jiboias, jararacas, teiús, tatus, bengos, calangos e catendes,
ratos, que fazem dali o seu habitat natural. Não, não, mil vezes não. Aquele
ecossistema é intocável. Aproveito desde já para convocar aqui os cidadãos, os
artistas, os intelectuais, sociólogos, ambientalistas, todos aqueles que por
cerca de dois meses embargaram as obras do túnel que está sendo construído no
cruzamento das avenidas Getúlio Vargas e Maria Quitéria, de onde foram
transplantadas algumas árvores em prol do progresso da cidade, a juntarem-se a
mim nesta luta e juntos vamos acampar no canteiro de obras (assim que ele for
montado) e não permitir que se faça tal agressão à flora e à fauna da nossa
cidade. A Folha Podre é nossa. É nosso direito líquido e certo.
Aliás, ao longo da história já perdemos
muita coisa por causa da nossa acomodação. A Lagoa do Prato Raso, situada à
margem leste da avenida José Falcão, era um belo eco sistema, e foi invadido
pela população para construir moradias, e hoje não é nem bairro nem lagoa, mas,
apenas uma invasão consentida pelas “otoridades” situada à beira de um poço
formado por esgotos sanitários, onde pululam cobras, ratos, baratas, mosquitos
(olha o aedes aegypt aí gente!) e de onde emana uma fedentina desgraçada em prejuízos
dos moradores dos conjuntos habitacionais próximos. Perdemos a lagoa e ganhamos
uma merda de favela. Ou vice-versa.
Lembro também que perdemos o “Ponto do
Coquinho”, simpático e adequadamente sujo boteco situado na esquina de um beco
na rua Araújo Pinho. Para lá se dirigiam todos os finais de tarde e fins de
semana, uma diversificada “fauna”. Eram biriteiros comuns, seguidos de
jornalistas, intelectuais, artistas, viajantes, periguetes, todo mundo
saboreando a cachaça que vinha dentro de um coco seco cuidadosamente guardado
em refrigerador. João do Coquinho, o anfitrião, tratava de servir as doses
coadas numa peneirinha em copos americanos. Uma delícia. Mas eis que o poder
público, em nome da tal mobilidade urbana, desapropriou os imóveis naquele trecho
para alargar o beco, levando assim de roldão, o nosso tradicionalíssimo e
cultural Boteco do Coquinho. Fosse nos dias de hoje, a banda ia tocar
diferente. Ia ter protesto e ação no Ministério Público. Começava com uma
“Lavagem do Beco do Coquinho”, com bandas de música, apresentações de artistas
locais, discursos de sociólogos, fogos de artifício, faixas e cartazes com
dizeres mais ou menos assim: “O Coquinho é nosso e ninguém tasca”: “Quebre meu
coquinho e nós quebramos seu coco”. E palavras de ordem como: João, João, João,
o coquinho é nosso, é a nossa tradição”!
Maravilha né. O beco iria continuar
apertado, engarrafando o trânsito, mas o Coquinho continuava lá. Eita coco
duro, oxente!
Portando meus caros concidadãos, uni-vos!
A catinga é nossa e ninguém tasca. Embarguemos o túnel do viveiros já!
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