*ASPIRAÇÕES*
São banais minhas aspirações atuais,
Em verdejante espaço, gatos miando, mãos enluvadas, costas ao sol. Cheiro de mato, roupa estendida, cocos caindo, vozes passantes. Sinete prenunciando a alimentação dos muitos gatos. Olhares felinos.
Surgidos do nada, num instante, famintos miados irrompem no silêncio reinante.
Envoltos em minhas pernas, me atropelam, rumo aos pratos. Gatos ingratos, mas amigos entre si.
Ao ensalivarem, por força da convocação sonora, (Pavlov explica) felinamente humanos, os mais fortes passam a distribuir unhadas às cabeças dos que dificultem a passagem.
Reprimo os mais valentes, querendo fazê-los entender haver ração bastante. (Melhor seria entendessem não haver razão bastante.) Ao servir as vasilhas, uma aqui, outra acolá, a sofreguidão é tal que os mais afoitos ao som do despencar da comida abandonam o prato abastecido e, açodados, se voltam ao novo ponto.
Gula elevada ao cubo. Expectativas de novidade na mesmice da mesmíssima ração de cada dia.
O ritual tem hora marcada. Pouco antes do meio-dia.
Instante que, finda minha rotina, precede a despedida ao verde envolvente, a retirada das luvas, a guarda do chapéu protetor da insolação, a coleta dos cocos, a retirada das roupas do varal e o banho gelado, ao ar livre.
Mudo, então, o foco-objeto de minha concentração.
Passo ao prazeroso trabalho de intentar descrever algo que, até aqui, não haja dito.
Em paralelo, deixo de lado lamúrias que nada resolvem.
Reclamações são infrutíferas. Reclamar é clamar duas vezes, ao fazê-lo, pois, trazemos para juntos de nós, aquilo que nos aflige.
Aprendi a amar os gatos. Permanecem horas a nosso lado, sem pressa alguma. Fingem-se de mortos, mas a qualquer som ou movimento brusco, correm atrás da presa, caçadores que são por vocação.
Já eu, mero caçador de palavras, esforcei-me em definir minhas banais aspirações.
Aspiro também 2021 menos tormentoso que o ano atual, a todos e todas que me honram com suas leituras. Feliz Ano Novo!
(E, para quem goste de gatos, também aspiro Felino Ano Novo.)
Agacê Ao apagar das luzes de 2020
Hugo A de Bittencourt Carvalho
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