sábado, 21 de maio de 2022

A modernidade, o sexo, e os sentimentos fugazes

        
A grande ambição do humano é a perenidade, seja da vida, ou dos sentimentos. Há, nos tempos atuais, no entanto, uma distância cada vez maior entre intenção e gesto. Acontece que o zeitgeist atual- o espírito do tempo- é o frugal, o passageiro. Vivemos atormentados pela velocidade e a ambição de viver todas possibilidades de forma feérica e em grandes quantidades, ainda que em detrimento da qualidade das experiências. Esta condição foi multiplicada pelo advento da revolução da internet e suas redes de comunicação, que, ao contrário de nos dar tempo livre- o que se imaginava com o invento do computador- , nos tornou presidiários sociais.
        A imposição, também, da felicidade permanente, obrigatória- e, agora, comparativa- tem causado efeitos colaterais como a descartabilidade e a incapacidade de sentimentos profundos e perenes. Estamos nos tornando incapazes de relações de longa permanência exatamente porque a superficialidade dos sentimentos não conferem proteção contra os dramas, ressentimentos e disputas, como dizia Nelson Rodrigues, dos casamentos e longos amores. Assim, findamos cada vez com mais brevidade. Conjuramos, no entanto, com facilidade surpreendente e rotatividade assombrosa, as mesmas juras de amor e de amizade.
        Por outro lado, quanto mais fácil o acesso e mais explicita a nudez, e o sexo, mais tédio. Eu disse exposição sexual - quase sempre tediosa-, e não erotismo, esta arte suprema da espécie humana e que tanto tem dado aos instintos, às artes plasticas, cinema e a literatura. Quanto mais o sexo perde a clausura, o seu ar, contraditoriamente, sacral, mais agressivo, mais transgressor precisa ser, pois sexo é, essencialmente, transgressão. Vejam em programas de reality show como é necessário, cada vez mais, aumentar o grau de exposição crua para que desperte a curiosidade do telespectador. E, olha que nem falei de despertar a libido do público.
        Esta urgência que alimenta a profunda incapacidade de emoções densas, que estamos vivendo, banaliza as relações, desagrega as famílias, dilui a
gratidão, até de filhos, relativiza as amizades, corrói os valores humanos da existência e expropria a alma de suas necessidades atemporais, como o amor.
A busca ancestral de um amor irrecusável, que não pode ter a pretensão de não acontecer, sob jugo de qualquer razão, ou espera, que denomina o outro como moradia e altar, se deixa tatuar feito pergaminho e converte o corpo em escritura e especiaria, deve continuar sendo nossa ambição derradeira.
        A recusa e a brevidade com qual temos nos deslumbrado- sem custos e sem esforços- talvez nos dê uma alegoria de felicidade, mas sem nunca termos provado o que nos faz verdadeiramente humanos.

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