quinta-feira, 1 de julho de 2021

O show do fim do mundo

    

    Desde tenra idade eu comecei a gostar de música. Ouvia muito rádio e discos e aprendia e cantava as músicas. Contam que uma tia minha chorava quando me via, com menos de cinco anos, sentado no meio da sala rodeado de brinquedos, cantando. Isso porque minha saúde era muito frágil, e o médico dissera que se eu passasse dos 5 anos, poderia sobreviver. Eu ouvia, aprendia e gostava de cantar boleros, guarânias, sambas canção e, principalmente, forró. E até hoje tenho um gosto muito eclético por música, mas primo pela qualidade. Tanto assim que, hoje em dia, só me interesso por músicas de 2000 para trás. Raríssimas músicas de depois dessa época, batem no meu paladar musical. Mas vou de Waldick Soriano a Beethoven tranquilamente.

Nos anos 60 veio a febre da Jovem Guarda e me contaminou. E na esteira vieram os festivais que trouxeram o novo tipo de música, a música de protesto, que gerou coisas boas e ruins. Veio a Bossa Nova, que todo mundo da minha época adora, mas eu gosto apenas de algumas músicas e de alguns intérpretes, e devo salientar que detesto João Gilberto. Tem algumas coisas dele que eu até gosto com outros intérpretes, mas com ele, definitivamente, não. Nos anos 80 a Música Popular Brasileira entrou com tudo, substituindo de vez o “estrangeirismo” desmedido que assolava os programas de rádio nos anos 50, 60 e 70. Aliás, nos anos 70, embora houvesse muita coisa boa vinda do exterior, principalmente da Itália, França e Estados Unidos, vinha também muita porcaria enlatada que o “populacho” consumia com avidez. Lembro de um colega de trabalho que qualquer bosta que se colocasse pra ele ouvir, ele sentenciava: “Internacional da porra”, que terminou virando um apelido dele.

Mas também foi no início da década de 70 que ouvi pela primeira vez um disco do Pink Floyd. Ouvi e gamei. Amor à primeira vista. “Meu Deus, o que era aquilo? Linda, diferente, envolvente, arrebatadora. Faltam-me adjetivos para descrever o que senti. E daí para Emerson, Lake & Palmer, Rick Wakeman, entre outros, foi um pulo de grilo. O disco “The Dark Side of the Moon” traduzia o sentimento de toda aquela geração. Calava fundo na mente e na alma. Era ao mesmo tempo lindo e assustador. Virei fã de carteirinha e até hoje, com a banda já desfeita, não me canso de ouvir seus discos. E se tornou um sonho de consumo (dos poucos que tive) assistir a um show da banda. Acalentei esse sonho até 2012, o ano em que a profecia dos Maias dizia que o mundo iria se acabar, que eu li nos jornais que Roger Waters, um remanescente da banda faria uma série de shows pelo Brasil. Tarde demais. O show mais próximo e onde eu teria o suporte da minha filha, que morava lá, seria em São Paulo, em março, no estádio do Morumbi. Não havia mais tempo para providenciar a grana para compra as passagens e o bilhete para o show. Entristecido, botei minha viola no saco e aquietei o facho.

Certo dia, me encontrava no meu “Uiscritório”, o Boteco do Vital, quando apareceu um amigo que eu sabia que iria assistir ao show, e eu disse: Tá chegando a hora, né, véi? E ele me respondeu: É. Você vai? Triste eu lhe disse que ainda não seria daquela vez. Foi quando Maura falou alto, me levando às lágrimas (inclusive agora): Você vai sim. Seu ingresso e suas passagens já estão compradas. Antes que eu dissesse qualquer coisa, ela explicou que, juntamente com alguns filhos, fez um “vaquinha” e comprou o meu ingresso e passagens para mim e para ela. Era pouco peito para tanta felicidade e alegria. E lá fui eu, antes que o mundo acabasse, assistir a um show, com a “Marca” e pelo menos uma voz do Pink Floyd. Coube ao sogro da minha filha, Frank Marcondes, a tarefa de me levar e ir me buscar depois do show. Chegando lá, ainda deu tempo de tomar uma cerveja perto do portão por onde eu entraria. E foi a partir dali que aconteceram coisas incríveis.

         Quando foi chegando a hora de abrir os portões, eu fui me dirigindo pra lá. Já quase chegando, ouvi sons de sirenes da polícia e vi todo mundo parar. Em se tratando de São Paulo, pensei logo em batida policial. Vi se aproximando carros pretos precedidos de batedores que pararam bem no portão onde eu estava. Antes do portão abrir, a janela do segundo carro se abriu, e quem apareceu para falar com a gente; Roger Waters. A simpatia em pessoa. Conversou com alguns fãs, deu alguns autógrafos, respondeu a perguntas, e seguiu em Frente. Eu não sou do tipo fã fanático, mas confesso que fiquei emocionado. Principalmente com a simplicidade e simpatia demonstradas, coisa muito rara entre famosos. Já na fila pra entrar, fiz amizade com um mineiro, Fernando Maldonado, com quem me correspondi até pouco tempo, até que sumiu do “Zap! Sem deixar pistas. Sentamos juntos na arquibancada e ficamos conversando antes do show começar, mais uma grande emoção eu senti. O som do estádio tocava músicas internacionais famosas, e em dado momento, começou a tocar Hey Judy. Vi e ouvi, uma multidão de 70 mil pessoas, da faixa etária de 12 a 60 anos cantando, em inglês, e muitos de mãos dadas e com lágrimas nos olhos, inclusive eu. Era muita emoção.

E pra encurtar a conversa, foi nesse show que eu descobri há quantos anos luz nós estávamos dos países mais avançados em termos de tecnologia. Entre alguns efeitos especiais, ví um avião cair no palco e “explodir”. Uma parede virtual sendo erguida na frente do palco até cobrir totalmente os artistas, e depois, um monte de martelos virtuais quebrando-a. Espetáculos de luzes de laser formando imagens no palco. E eu não vou nem falar da qualidade do som, porque tem que ouvir para crer. E mais uma lição para nosoutros. O Show estava programado para começar às nove, e começou às 9. Disseram que o intervalo duraria 30 minutos, e durou 30 minutos. Afinal, eles são britânicos.

E foi assim que o mundo não se acabou e eu realizei o último dos meus sonhos.

Obrigado família! Obrigado Deus!

 

Um comentário:

Unknown disse...

Parabéns amigo velho, muito bom, muito bom mesmo,gosto de lê suas histórias, são claras, simples e muito bem explicativas.
Eu aqui na torcida aguardando o próximo episódio.
Abraços e saudações tricolores.
Bora Baheaaaaaa M.P.