segunda-feira, 12 de agosto de 2019

Brasil x Suécia: como vivem e trabalham os políticos nos dois países


"Sério?", reage o deputado sueco David Josefsson, entre discretos risos de incredulidade, ao ouvir que no Brasil um único parlamentar (o senador Izalci Lucas, do PSDB-DF) já chegou a ter 85 funcionários durante o mandato. No sistema sueco, nenhum parlamentar tem direito a secretário ou assessor particular. Cada partido político representado no Parlamento recebe uma verba restrita para contratar um grupo de assessores, que atende coletivamente a todos os deputados de uma mesma sigla. E estes recursos cobrem, em média, apenas a contratação de um assessor para cada parlamentar.
"Não vejo problema nenhum. Esta é a nossa realidade, é a forma como trabalhamos. Não é irreal fazer um Parlamento funcionar com uma quantidade limitada de assessores", diz à BBC News Brasil o deputado David Josefsson, membro do conservador Partido Moderado e presidente da Associação Sueco-Brasileira de parlamentares do Riksdag (Parlamento sueco).

"Também me parece que empregar um número exorbitante de assessores é um desperdício de dinheiro público", avalia Josefsson. "Evidentemente, estamos falando aqui do dinheiro dos contribuintes, e é claro que os políticos devem ser cuidadosos ao gastar este dinheiro."
No Brasil, os deputados federais têm direito a contratar até 25 funcionários, e os senadores, o dobro disso. Enquanto isso, no Parlamento sueco, o gabinete de 7m² do deputado David Josefsson mostra que ali nem caberia mais uma pessoa.
Assistentes pessoais para deputados também não existem na Suécia: apenas os líderes partidários e o secretário-geral de cada partido contam com um auxiliar para tarefas como agendamento de reuniões e viagens.
"Todos os deputados devem cuidar de suas próprias tarefas pessoais", diz Thomas Larue, diretor do Secretariado de Análise e Pesquisas do Parlamento sueco e doutor em Ciências Políticas.

Rotina sem assessores particulares

David Josefsson conta como é a vida de um deputado sem assessores particulares - e também sem verba extra para alugar escritório na sua base eleitoral, diferentemente do que ocorre no Brasil.
"Às segundas e sextas-feiras, como todos os demais deputados, desempenho atividades na minha base eleitoral, que é a região de Gotemburgo. Meu partido tem um escritório na cidade, mas eu não tenho direito a ter uma mesa ali. Portanto, quando estou em Gotemburgo eu trabalho de casa, com meu telefone e computador", diz.
Nas bases eleitorais, grande parte do tempo de um deputado também é dedicado a participar de debates, além de reuniões com eleitores e diferentes grupos da sociedade civil.
"Como qualquer outro deputado, quando trabalho de casa eu faço minhas reuniões em cafés, hotéis ou na biblioteca pública da cidade", explica.
De terça a quinta-feira, a rotina da vida parlamentar na capital sueca começa às 8h.
"O dia de trabalho começa em geral com reuniões no café da manhã com associações de eleitores, ONGs ou empresas. Às 9h, temos as reuniões dos subcomitês e comitês do partido. Em seguida, normalmente me dedico a responder emails, manter conversas telefônicas ou escrever discursos, artigos e moções, por exemplo. Terça-feira é o dia em que todos os partidos políticos realizam convenções com todos os seus membros no Parlamento, na parte da tarde. Às quartas e quintas-feiras pela tarde, temos as sessões no plenário do Parlamento a partir das 16h", descreve Josefsson.
O próprio Josefsson é responsável por organizar a agenda e divulgar suas atividades parlamentares nas redes sociais - já que, na Suécia, também não há verba para divulgação das atividades de mandato.
A ajuda que ele recebe do pool de assessores parlamentares é pontual: os assessores atuam principalmente junto aos líderes do partido e na assistência aos diferentes comitês do Parlamento. Um time de assessores de imprensa também auxilia os deputados nas relações com a mídia.
"É nos comitês que temos uma ajuda mais direta e específica dos assessores. Sou membro do comitê de Habitação e Direitos Civis, e ali temos dois assessores que nos auxiliam em uma série de tarefas, como, por exemplo, trazer observações encaminhadas por organizações da sociedade civil sobre novas políticas, organizar reuniões, preparar moções e também intermediar nossas negociações com outros partidos do Parlamento", explica.
Para fundamentar suas propostas e moções, Josefsson recorre ao Serviço de Pesquisas do Parlamento (RUT- Riksdagens utredningstjänst): diferentemente do que ocorre no Brasil, na Suécia os deputados não recebem verba extra para contratar consultorias externas.
Com atribuições semelhantes à Consultoria Legislativa do Congresso brasileiro, o RUT é um órgão do Parlamento sueco que reúne economistas, cientistas políticos, juristas e especialistas em diversas áreas - todos a serviço dos 349 parlamentares de todos os partidos.
"Os consultores do Serviço de Pesquisas do Parlamento são altamente capacitados, e quando um deputado usa o RUT para elaborar um projeto, todos sabem que o resultado é um produto profissional. Não é um serviço de consultoria qualquer", aponta o cientista político e autor sueco Stig-Björn Ljunggren.
Estes consultores altamente especializados estão à disposição dos deputados para tarefas como pesquisas customizadas, assessoria financeira e jurídica, cálculos de estatísticas regionais e internacionais, e análises de consequências da aplicação de reformas e mudanças.
"Mas no dia a dia, todos nós, deputados, temos que cuidar de nossas próprias tarefas. Os assessores do partido não estão à nossa disposição para tarefas corriqueiras", acrescenta o deputado.

Parlamentares sem autonomia

Os assessores do Parlamento sueco são divididos em três categorias: secretários políticos, assessores políticos e assessores de imprensa. Em seu conjunto, eles são chamados de secretariado do partido.
Os secretários políticos são uma espécie de versão mais qualificada dos estagiários que trabalham no Congresso americano e na Casa Branca: suas tarefas incluem atender telefonemas no anexo do partido no Parlamento, organizar reuniões, prestar auxílio na elaboração de projetos e preparar os parlamentares para visitas específicas a fábricas ou organizações sociais, por exemplo.
Já os assessores políticos devem ter expertise comprovada em campos específicos do conhecimento, a fim de prestar assessoria qualificada aos deputados que, em todos os partidos, atuam como porta-vozes em áreas como economia, agricultura ou questões relacionadas aos direitos da comunidade LGBT.
No caso do Partido Moderado, 16 dos 70 deputados da sigla desempenham a função de porta-vozes em diferentes áreas.
"Portanto, os assessores políticos trabalham majoritariamente com estes deputados, e também nos diferentes comitês parlamentares", explica Tom Samuelsson, do secretariado do Partido Moderado.
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