76720 é o número de focos de incêndio
registrados desde o início de 2019 até o dia de hoje (23). O número é
atualizado todos os dias. De ontem para hoje, mais de mil novos focos
foram computados. O valor já é 85% maior que o do mesmo período do ano passado. Metade
desses focos estão na Amazônia. Os dados são do Instituto Nacional de
Pesquisas Espaciais (Inpe) e podem ser acompanhados diariamente, nos
mínimos detalhes, por meio do Programa Queimadas.
Primeiro, é importante
lembrar que essa situação não é incomum. A foto ali em cima, por
exemplo, foi tirada no Acre dois anos atrás. Todos os anos, entre junho e
novembro, a Amazônia passa por seu período de seca, e os incêndios
florestais são parte natural dele. O
que chama a atenção, neste ano, é a rapidez com que os incêndios estão
crescendo em comparação ao mesmo período dos últimos anos. Só na semana
passada, surgiram 9 mil novos focos no país, o maior índice desde 2013.
Se voltarmos um pouquinho no tempo,
encontramos precedentes para a situação atual. Em 2007, por exemplo,
foram registrados 394 mil focos de incêndio no país ao longo do ano. De
1998 até hoje, a média de focos de incêndio registrados no mês de agosto
é de 46 mil. Ainda estamos abaixo desse número, com 38 mil focos até
agora. O que preocupa os
ambientalistas é que estamos apenas no início do período de seca. Ou
seja: a marca tem bastante tempo para aumentar.
O engenheiro florestal Rubens Benini é
líder de restauração florestal da The Nature Conservancy da América
Latina, uma organização global de preservação ambiental. Ele explicou
para a SUPER em que aspectos a situação atual é normal – e em que
aspectos ela não é.
Por que a estiagem deste ano é mais preocupante que a dos outros anos?
O primeiro fator é que a temperatura do planeta está aumentando. Julho de 2019 foi o mês mais quente da história da humanidade.
O segundo é o sentimento de impunidade dos proprietários de terra e de criminosos que praticam, por exemplo, grilagem [o crime de falsificar documentos para conseguir posse sobre um terreno]. Eles se sentem incentivados a praticar crimes ambientais porque
a atuação de órgãos de controle federais e estaduais está bem menos
severa. O enfraquecimento da fiscalização é um fator importante.
Anos como 2005 e 2007 também registraram números alarmantes. As causas foram diferentes?
Os anos em que houveram grandes focos
de incêndio, como 2005 e 2007, foram anos de El Niño. Ou seja, são anos
com períodos de estiagem mais longos. Havia um intervalo maior entre uma
chuva e outra. Este ano não está
sendo tão severo. O período de estiagem não é tão grave. O que ajuda a
ter uma noção da parcela dos incêndios que tem motivação criminosa. (Super Interessante)
Como nós sabemos que os incêndios são majoritariamente culpa da ação humana, e não fenômenos naturais?
É assim: quando a floresta é cortada
para dar lugar à agropecuária, acabam surgindo pequenas ilhas de
floresta, chamados tecnicamente de fragmentos florestais. Como
esses fragmentos estão isolados, as bordas deles ficam expostas. A luz
solar e o vento entram com muito mais força pelos cantinhos. Isso
diminui a umidade e aumenta a temperatura desses pedaços de floresta, o
que aumenta o risco de incêndio. A gente chama isso de “efeito de
borda”. Não é coincidência que os dez municípios mais desmatados foram também os que tiveram mais focos de incêndio.
Qual é a tendência para o resto da temporada de seca?
Historicamente, os maiores focos de incêndio ocorrem nos próximos meses, os mais quentes.
O que fazer para evitar o aumento dos incêndios?
Primeiramente, punir os criminosos e
aumentar a fiscalização. Outro ponto é não recusar ajuda nenhuma. Se nós
não temos capacidade de combater os incidentes na velocidade em que
eles ocorrem, nós devemos aceitar ajuda. Eu
tenho pensado muito nessa situação nos últimos dias. Nós ainda estamos
dentro da média para o mês de agosto, mas alguma coisa chamou a atenção:
apesar de vivermos em uma era de tecnologia, foi um sinal de fumaça que
fez o mundo abrir os olhos para a Amazônia.
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