Vez por outra,
com os filhos longe, me pergunto se fiz as escolhas certas, se dei os
exemplos adequados, se fui capaz de defendê-los como deveria, e
libertá-los, como necessário. É que os tempos andam tão estranhos e os
educadores de miolo mole embaçaram a figura paterna por uma igualdade
politicamente correta, como se para compor um filho fossem melhor duas
mães, afinal, o vendido é que masculinidade é tóxica, autoridade é
ditadura, valores são relativos, e família não é importante, porque é
disfuncional.
Sou de poucas lições, que não passo de um besta
diante desse mundo, que até me envergonho. Na escassez, sinalizei o que
pude: não tenham o que não puderem, não devam nada a ninguém, nem gastem
tudo que tem, nunca se deixem dominar, sejam do bem, façam o que tem de
ser feito, guardem a quem amam, tenham cuidado com o que não pode ser
desfeito. Não é verdade que manga com leite faz mal, mas é verdade que
tirar a colher da boca e botar em uma comida com molho, faz azedar. E
que há coisas monumentais e imutáveis: o ciclo do sol e da lua, o fluxo
das marés, a estreia da primavera. E filhos.
Sei que descobrirão
que aqui e ali, viver, dói- a vida, e o amor, aprontam surpresas-, mas o
otimismo é sempre melhor que o pessimismo. Tenham fé na bondade e
resistam. Resistam que a vida vale a pena. As alegrias são maiores que
as dores, o bem dos amigos é maior que o mal dos inimigos, a beleza é
maior que a feiura, as decepções são menores do que os deslumbramentos
da existência. Não fiquem só. Cuidem dos amigos, e façam sim um mundo
melhor, sem medo, porque o medo é a armadilha dos sonhos. Nunca se
recusem a dizer algo de bom a alguém, que a gentileza é um bálsamo.
Durmam oito horas por dia, estudem, leiam. Ler foi meu fio de Ariadne,
me guiou, e me deu os melhores momentos de minha vida. Eu nada seria sem
as palavras. Nem pai.
Tenham filhos, que ter filhos, apesar de
imprevisível, é o único milagre genuíno. E sejam seus cúmplices, mas sem
abrir mão do que lhes cabe nesse latifúndio. Conte-lhes histórias- quem
sabe aquela do barquinho medroso-, ensine que o trabalho não cansa, e
realiza, e, mais tarde, que nem todos os vinhos são iguais. Ensine-os,
embora a vida seja sempre inaugural para cada um, e um dia eles dirão ao
próprio filho: seu avô dizia isso. E será a senha para permanecermos
juntos.
Faça com que aprendam que a primeira coisa que se diz na
casa do pai- ou Hakuna Matata-, é bom dia. E contemplem a vida como se
fosse iluminada por mil faróis. Ela é. Sejam seus mirantes.
Por
fim, um pedido. Cuidem daqueles ipês e flamboyants que plantei em nome
de vocês, lá na roça- ao fim, sou só mais uma árvore de lá-, e quando eu
tiver partido-espero que não cedo demais-, se puderem vez ou outra vão
por lá na minha morada derradeira. Sentem no banquinho que vou deixar.
Filho se puder toque uma música que amo lhe ouvir. Filha se você não
errar o caminho, chegar lá, e vier uma lágrima, não se importe. Ela
servirá para aquecer seu coração.
E onde estiver eu saberei que vocês fizeram de ser pai o terreno sagrado em que vale a pena pisar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário