terça-feira, 18 de setembro de 2012

Embora forte no Município, Agricultura Familiar tem problemas



Antigamente a zona rural de Feira de Santana era marcada pela cultura de subsistência, com base no plantio de milho, feijão, mandioca e fumo. Hoje em essas culturas foram diversificadas e são chamadas de Agricultura Familiar, que gera trabalho e renda suficientes para manter os pequenos produtores rurais no campo, evitando assim o êxodo rural. Se planta e se cria de tudo e o mercado absorve bem a produção, mas, problemas pontuais e antigos ainda ameaçam a zona rural. Segundo a agricultora Conceição Borges, que diversas vezes dirigiu o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Feira de Santana, se estes problemas não forem resolvidos, de nada terá adiantado todo esforço desprendido até agora, e as ameaças podem se concretizar, inclusive o êxodo rural, que, de uma certa forma já existe. “Ou a gente se une para planejar e executar nosso trabalho no campo, ou daqui há alguns dias vão ter que fabricar alimentos por computador. Aí eu quero ver como é que vai ser” preconiza.
         Com o apoio técnico de instituições particulares como o Movimento de Organização Comunitária (MOC), e Associação de Desenvolvimento Sustentável e Solidário da Região Sisaleira (Apaeb),e também de órgãos governamentais, os pequenos produtores rurais do semiárido estão aprendendo a conviver com as estiagens, superando dificuldades e aumentando a produção. E o mercado absorve bem. “Hoje, se eu tenho 100 galinhas caipiras prontas para o abate, eu não preciso ir buscar mercado, porque se algum dono de restaurante descobre, vai lá buscar na porta”, diz Conceição Borges.

         Mas nem tudo são flores. A questão da posse da terra, por exemplo, ainda não está resolvida. Ainda são poucos os pequenos produtores da região que detém o título de posse da terra. À medida que os filhos foram crescendo os antigos proprietários foram subdividindo suas posses entre eles, e esses títulos nem sempre foram oficializados. E para ter acesso a alguns benefícios do governo, o agricultor tem que ser o dono da terra. Isso tem sido alvo de debates, de mobilização, de manifestações, para cobrar da Coordenadoria de Defesa Agropecuária (CDA), que é o órgão do governo  habilitado a regularizar toda essa questão fundiária.
O trabalhador que tem até uma tarefa de terra, para ter acesso ao crédito, a recursos de banco, financiamentos, só consegue se tiver o documento de posse, entre outros, como declaração do Imposto Territorial Rural (ITR), ou então se alguém da família ceder a terra em contrato de comodato. Aí ele pode ter acesso a qualquer benefício do governo do estado ou do governo federal, dos programas da Agricultura Familiar, como o PRONAF e Garantia SAFRA.

Iniciativas
Segundo Conceição Borges aumentou em mais de 50% o criatório de galinha caipira aqui no Município.Mas mesmo com todo mundo criando, a gente não dá conta da demanda do mercado. É preciso se organizar. Os pequenos abatedores têm que se organizar, porque se a gente beneficiar carne de frango, se a gente estiver com a marca do abatedouro, com a marca da Agricultura Familiar, o preço será bem melhor porque vamos agregar valores ao nosso produto”, diz ela.

         Questionada sobre a comentada falta de iniciativa do homem do campo, Conceição Borges argumenta que certos benefícios do governo precisam de complemento. Como exemplo ela cita a energia elétrica que tem chegado às propriedades rurais da região. “Serve para clarear, para botar um freezer num bar, ter uma geladeira, mas tem outros detalhes. Se eu botar uma bomba para puxar água e irrigar uma horta, é capaz de eu não poder pagar a conta da energia. É a mesma coisa com a água da Embasa. Tudo isso passa por um projeto de desenvolvimento sustentável. Ou seja, não basta levar água encanada e energia. Tem que dar projetos, assistência técnica e subsídios para que se possa produzir. Água para Todos, é muito bacana, mas a gente precisa de água pra tudo. Água para todos é na cidade, no campo a gente precisa para tudo, inclusive para produzir”, diz. 

Êxodo oculto
Um problema detectado em Feira de Santana pode estar ocorrendo em outras regiões do Brasil que é um êxodo oculto. Com a melhoria dos acessos, com a maior oferta dos transportes coletivos, a facilidade da aquisição de meios próprios, como as motocicletas, e o conforto proporcionado por água encanada, energia e telefonia, a vida no campo ficou melhor. Mas um detalhe preocupa, que é o fato de que os filhos dos pequenos produtores, vivem no campo mas não querem trabalhar na terra. A maioria tem emprego no comércio e na indústria e só vai em casa para dormir.
Isso, futuramente, pode implicar em desabastecimento das cidades. O campo já está consumindo quase tudo que produz e a produção não está aumentando, pelo contrário, está diminuindo. “Vai chegar uma hora que nós não vamos ter o que comprar, vamos ter que importar produto. Aqui em Feira de Santana nós quase já não temos. E tem um agravante, que é o empobrecimento do solo. Mesmo que tenha aquele agricultor com aquela vontade, com a aquela paixão de continuar plantando, a nossa terra tá pobre. Se não houver uma preocupação dos órgãos técnicos em proporcionar o desenvolvimento sustentável no campo, vai faltar comida. Pelo menos aqui na nossa região”, alerta Conceição Borges.
 
Matéria de Cristóvam Aguiar. Publicada no Jornal Tribuna da Bahia (18/09/20212)

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