Uma mulher americana de 25 anos que garante não ter nenhum grau de
parentesco com aracnídeos ou nobres deu entrada no hospital de
Providence – capital de Rhode Island, na costa leste dos EUA – com o
sangue da cor de um tubinho de caneta esferográfica. Dá uma olhada:
O caso incomum foi descrito brevemente por dois médicos no New England Journal of Medicine,
um periódico especializado. Após um dia se sentindo fraca, cansada e
sem fôlego, a paciente notou que sua pele estava pálida e azulada.
Manchas escuras haviam se formado nas unhas. Esse quadro é chamado pelos
médicos de cianose – que deriva da palavra ciano, um nome chique para a cor turquesa.
A paciente havia aplicado uma pomada anestésica de benzocaína na
gengiva após um procedimento dolorido no dentista – mas exagerou na
dose. O medicamento desencadeou um aumento nos níveis de
meta-hemoglobina no sangue. A meta-hemoglobina é uma variação da
hemoglobina – um proteína com ferro na fórmula que é responsável por
aderir ao oxigênio e transportá-lo à bordo de células chamadas glóbulos
vermelhos (hemácias).
Coisas que contém ferro, tipo hemoglobina ou o planeta Marte,
costumam ser vermelhas. A meta-hemoglobina, por outro lado, dá ao sangue
a cor azulada da foto acima – e adere ao oxigênio com muito mais
entusiasmo que sua versão comum.
Normalmente, o sangue é como um carrinho de aeromoça, que passa pelos
corredores do avião fornecendo alimento (oxigênio) para os passageiros e
coletando o lixo (gás carbônico) que eles geram. Os passageiros, é
claro, são os órgãos e tecidos do nosso corpo. A meta-hemoglobina, por
outro lado, não fornece o gás vital: ela se agarra ao dito-cujo e não
solta. É como se os comissários de bordo escondessem os lanchinhos nos
bolsos em vez de entregá-los.
Isso explica a fadiga e a falta de fôlego da moça: suas mitocôndrias,
as usinas de energia das células, estavam sem oxigênio para queimar. No
momento em que fez os exames, 44% de suas hemoglobinas haviam se
convertido em meta-hemoglobinas.
Ironicamente, o antídoto para meta-hemoglobinemia – o nome oficial do problema – é ingerir uma substância chamada azul de metileno.
Ele é capaz de converter as meta-hemoglobinas de volta em hemoglobinas
comuns. E também é capaz de estrelar um poema de Carlos Drummond de
Andrade, que era farmacêutico de formação: “No azul do céu de metileno /
a lua irônica / diurética / é uma gravura de sala de jantar.”
Voltando ao assunto: aranhas e outros aracnídeos também são famosos
por terem sangue azul. Mas isso é porque as moléculas transportadoras de
oxigênio desses animais são baseadas em cobre, e não em ferro.
A mulher retomou o fôlego pouco tempo após ser medicada e foi
liberada. Da próxima vez, talvez valha mais a pena aguentar um pouquinho
a dor de dente. (Super Interessante)
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