
É preciso deixar claro que a pandemia não é culpa de autoridades- é da
China-, mas a forma de enfrentamento é. Algumas verdades, também,
precisam ser claras. A primeira é que distanciamento social produz
achatamento da curva, mas prolonga a duração da pandemia; a ausência
dele encurta a duração, mas mata muito mais, inclusive a quem não iria
morrer, se o sistema de saúde não estivesse saturado. Nós tivemos esse
efeito de achatamento em Feira, Salvador, e em inúmeros lugares no mundo
onde foi aplicado.
Esse distanciamento não se destina a evitar que todos peguem a doença o
que não é possível pela inter-relação humana e as falhas de proteção a
que estamos sujeitos. Não é pouco comum vermos grupos de amigos, ou
famílias reunidas, sem máscaras, como se laços de amizade ou de
parentesco impedissem a transmissão do vírus. Conheço uma família em que
um membro contaminado repassou a mais oito pessoas em um agradável
almoço de domingo. Ou uma confraternização de colegas de trabalho ao
redor de um bolo de aniversário que gerou outro conjunto de
contaminados.
O distanciamento, alargamento da curva, se destina a que o sistema de
saúde se prepare, construa hospitais de campanhas, adquira medicamentos,
respiradores, em número suficiente para dar suporte a demanda, vigiando
os números e flexibilizando o comércio a partir da oferta de vagas e
dos sinais dos testes, e não da pressão dos comerciantes no juízo do
governante. Ou seja, é preciso manter o R0( capacidade de contágio do
vírus), sob controle para que as variáveis doença, leito, comércio,
possa ser equilibrada.
Outro aspecto que foi negligenciado pela Prefeitura, Estado, governo
federal, é a capacidade de testagem de suspeitos. Contagiamos com
maestria e irresponsabilidade e testamos como um perna de pau, e sem
noção. Não se enfrenta adequadamente aquilo que não se conheçe.
Os que advogam a "imunidade de rebanho"' ou seja contagiar todo mundo
logo para ter imunidade o fazem, em sua maioria, em isolamento e
desejando que os 70% necessários sejam feitos com os riscos dos outros. É
o morra quem morrer, celebrado sem pudor pelo eugenista de Itabuna.
A curva de crescimento de casos de Feira assusta mas não é um fenômeno
inesperado. Ela saiu de 500, em Maio, para 3500, em Junho, e dá sinais
que será maior que isso, em Julho, em um sistema já sobrecarregado. O
horizonte, se nada for feito, trará a exacerbação da angústia e mortes.
Já há feirenses disputando leitos de UTI, em Salvador.
Teremos 30 novos leitos, no HGCA, ainda essa semana, segundo o
Secretário Fábio Vilas Boas. Será um alívio, mas temo que não sejam o
bastante, se a curva não for mudada.
Como exaustivamente demonstrado nos resultados do mundo inteiro, só o
bloqueio total ( lockdown) é capaz de mudar a curva na situação de
transmissão desenfreada. É necessário, mas pega a população já cansada,
em parte dela- não toda- com dificuldades econômicas, e confusa com o
entra e sai do bloqueio que sempre foi parcial. Por outro lado, parcela
da população segue agindo de forma absolutamente irresponsável, lotando
barzinhos,como se não houvesse cerveja amanhã, bancando uma contestação
vazia da autoridade, fazendo festas como a blogueira que viralizou essa
semana sua rasura de pensamento, esquecendo que, se sentem que a doença
não lhes será fatal, seu caso poderá ocupar um leito de quem precisa.
Seja como for, a dramática situação da cidade exige algo além disso e
que o prefeito e o governo do Estado, conversem, afinem uma agenda
mínima de intervenção, de proteção às vidas, e anunciem ao povo feirense
o que esperamos deles:vagas, testes, fluxograma de ação conjuntas, como
foi feito em Salvador.
O preço a ser cobrado, será de ambos; o preço a ser pago, será só nosso.
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