segunda-feira, 6 de julho de 2020

Morra quem morrer

O prefeito de Itabuna, o necrófilo Fernando Gomes, disse em entrevista que vai abrir o comércio e "morra quem tiver de morrer". Animais políticos costumam pensar mais em votos que em vidas e não se poderia esperar mais que isso do tristemente, agora, famoso prefeito da caótica cidade que ele administra.
É preciso deixar claro que a pandemia não é culpa de autoridades- é da China-, mas a forma de enfrentamento é. Algumas verdades, também, precisam ser claras. A primeira é que distanciamento social produz achatamento da curva, mas prolonga a duração da pandemia; a ausência dele encurta a duração, mas mata muito mais, inclusive a quem não iria morrer, se o sistema de saúde não estivesse saturado. Nós tivemos esse efeito de achatamento em Feira, Salvador, e em inúmeros lugares no mundo onde foi aplicado.

Esse distanciamento não se destina a evitar que todos peguem a doença o que não é possível pela inter-relação humana e as falhas de proteção a que estamos sujeitos. Não é pouco comum vermos grupos de amigos, ou famílias reunidas,  sem máscaras, como se laços de amizade ou de parentesco impedissem a transmissão do vírus. Conheço uma família em que um membro contaminado repassou a mais oito pessoas em um agradável almoço de domingo. Ou uma confraternização de colegas de trabalho ao redor de um bolo de aniversário que gerou outro conjunto de contaminados. 
O distanciamento, alargamento da curva, se destina a que o sistema de saúde se prepare, construa hospitais de campanhas, adquira medicamentos, respiradores, em número suficiente para dar suporte a demanda, vigiando os números e flexibilizando o comércio a partir da oferta de vagas e dos sinais dos testes, e não da pressão dos comerciantes no juízo do governante. Ou seja, é preciso manter o R0( capacidade de contágio do vírus), sob controle para que as variáveis doença, leito, comércio, possa ser equilibrada. 
Outro aspecto que foi negligenciado pela Prefeitura, Estado, governo federal, é a capacidade de testagem de suspeitos. Contagiamos com maestria e irresponsabilidade e testamos como um perna de pau, e sem noção. Não se enfrenta adequadamente aquilo que não se conheçe.
Os que advogam a "imunidade de rebanho"' ou seja contagiar todo mundo logo para ter imunidade o fazem, em sua maioria,  em isolamento e desejando que os 70% necessários sejam feitos com os riscos dos outros. É o morra quem morrer,  celebrado sem pudor pelo eugenista de Itabuna. 
A curva de crescimento de casos de Feira assusta mas não é um fenômeno inesperado. Ela saiu de 500, em Maio, para 3500, em Junho, e dá sinais que será maior que isso, em Julho, em um sistema já sobrecarregado. O horizonte, se nada for feito, trará a exacerbação da angústia e mortes. Já há feirenses disputando leitos de UTI, em Salvador. 
Teremos 30 novos leitos, no HGCA, ainda essa semana, segundo o Secretário Fábio Vilas Boas. Será um alívio, mas temo que não sejam o bastante, se a curva não for mudada.
Como exaustivamente demonstrado nos resultados do mundo inteiro, só o bloqueio total ( lockdown) é capaz de mudar a curva na situação de transmissão desenfreada. É necessário, mas pega a população já cansada, em parte dela- não toda- com dificuldades econômicas, e confusa com o entra e sai do bloqueio que sempre foi parcial. Por outro lado, parcela da população segue agindo de forma absolutamente irresponsável, lotando barzinhos,como se não houvesse cerveja amanhã, bancando uma contestação vazia da autoridade, fazendo festas como a blogueira que viralizou essa semana sua rasura de pensamento, esquecendo que, se sentem que a doença não lhes será fatal, seu caso poderá ocupar um leito de quem precisa. 
Seja como for, a dramática situação da cidade exige algo além disso e que o prefeito e o governo do Estado, conversem, afinem uma agenda mínima de intervenção, de proteção às vidas, e anunciem ao povo feirense o que esperamos deles:vagas, testes, fluxograma de ação conjuntas, como foi feito em Salvador. 
O preço a ser cobrado, será de ambos; o preço a ser pago, será só nosso.

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