terça-feira, 2 de março de 2021

As distorções do Lockdown

Desde o cancelamento de Karol Koncá, no BBB, um assunto não atingia de forma tão passional os brasileiros, quanto o lockdown. Há os que dizem que ele não salva ninguém e mata a economia , e outros que apontam como uma das ferramentas essenciais para salvar vidas, porque economia volta, vidas perdidas não. Evidente, também, que fazer lockdown em país desenvolvido com população de maior poder aquisitivo e suporte social é muito diferente de fazer no Brasil, um país esfacelado pela corrupção, pobreza, e inépcia jurídica. É provável, no entanto, que todos tenham lá suas razões, mas acho que o debate acontece sobre objetivos que não são objeto do lockdown.
O lockdwon não é para salvar vidas- ao menos, não diretamente- não é uma terapêutica. O que ele produz é uma redução da taxa de contágio – e isso está provado exaustivamente em todos países que o fizeram, e em trabalhos científicos brasileiros - permitindo que a relação usuário/vaga do sistema de saúde se torne equivalente, ou próximo disso, o que levaria a salvar vidas que se perderiam por falta de leitos.
Na primeira onda da pandemia o objetivo do distanciamento era alongar a curva, ganhando tempo para que fossem comprados os insumos hospitalares que estavam em falta – máscaras, luvas, aventais, respiradores- e fossem ampliados os leitos hospitalares. E funcionou. Em vários Estados que agiram corretamente- a Bahia, por exemplo- não houve colapso da saúde, nem falta de vagas.
Já, em Manaus, a combinação de fracassadas administrações municipais e um governador acusado de corrupção criaram o ambiente para o surgimento de uma nova cepa- com maior carga viral e maior poder de contágio- levou ao colapso do sistema de saúde.
A combinação de maior número de casos, maior taxa de contágio, maior tempo de ocupação de leitos por ser uma forma mais grave da doença, menor número de leitos já que hospitais foram fechados ou sequer abertos com o desvio de recursos, está levando ao caos, agora, nacional.
Aprendemos, com os resultado de Israel- que já vacinou 57% da população e viu a taxa de casos cair de forma abrupta- que só a vacina será capaz de controlar a perpetuação da pandemia por novas cepas do vírus. Infelizmente o governo brasileiro, defensor da eugênica imunidade de rebanho, foi absolutamente desastroso na compra de imunizantes- e fomos salvos, ao menos minimamente, graças ao Butantã - e agora corre atrás do prejuízo.
Enquanto aguardamos a chegada da vacina dependemos de conter a pandemia no limite que possamos lidar com ela. Novamente, o objetivo do lockdown não é impedir o total contágio- como se prega equivocadamente- mas, achatar a curva e permitir que a relação vaga/ paciente seja mantida em um padrão satisfatório. Para isso devemos cobrar mais leitos, mais transparência, mais fiscalização das verbas ( algo do qual sempre nos omitimos) mas, também, participação da sociedade.
A situação é dramática, mas poderá ser ainda pior o que vamos ver, por isso o lockdown pode ser necessário, ainda que não tenhamos fôlego para longa intervenção. É preciso compreender o sufoco econômico das pessoas, e seus legítimos argumentos, e tentar flexibilizar ao máximo o que for possível, mas reconhecer o papel do distanciamento, parar de distorcer objetivos da medida, cobrar ação do Estado, exigir compra das vacinas, porque senão os que ficarão sem fôlego serão aqueles que não voltarão à vida.

Nenhum comentário: