quarta-feira, 29 de dezembro de 2021

Origem de frases feitas (Parte 2)

        

    Conforme prometido, vamos dar sequenciar com os resultados da nossa pesquisa sobre frases feitas, coletadas da obra de Carlos Drummond de Andrade. Infelizmente não temos o nome do autor ou autores desse trabalho que encontramos na Internet e que é muito interessante. Publicamos uma parte há algum tempo, e publicamos agora uma segunda parte. Esclarecemos que nem todas as frases contidas no trabalho foram coletadas, pois ficaria muito extenso o texto. Utilizamos aquelas que julgamos mais interessantes e até mesmo aquelas que mais utilizamos no dia a dia aqui na nossa região.

Meter-se em Camisa de Onze Varas

A explicação de Câmara Cascudo tem como base ou argumento mais forte os Estatutos da Confraria de Santa Maria do Castelo de Thomar, de 1388. Diz, a certa altura, este estatuto: “Se algum Confrade ferir outro Confrade com espada ou com coytello, entre em camisa em tagantes. Aquele que a seu Confrade der punhada, ou lhe messar a barba, entre em camisa a cinco tagantes”. Sabendo-se que tagante é o choque do açoite, meter-se em camisas de onze varas é o mesmo que entrar em camisa a onze tagantes. Como lembra Cascudo, “a pena seria rápida e pouco dolorosa", mas se tornava humilhante por ser apregoada e pública. Daí ser tão temida. As chicotadas por cima da camisa, além disso, lembravam que o sentenciado ou condenado era um fraco, que não resistiria os açoites sobre a pele, comparado a uma mulher torpe.

Entrar pelo Cano

Equivale a se dar mal em alguma empreitada. Uma expressão similar é “embarcar em canoa furada”. Acredita-se que o “o cano”, nesta expressão, é o cano do esgoto, o que parece ser a verdade. Além disso, entrar bem é uma variante de entrar pelo cano, com o sentido de entrar profundamente pelo cano, ou seja, acrescentando-lhe a ideia de intensidade. Se dá bem quem entra pela porta da frente ou outras vias usuais.

Casa da Mãe Joana

Joana, rainha de Nápoles e condessa de Provença (1326-1382), em sua tumultuosa existência, refugiou-se no Avignon em 1346. No ano seguinte, regulamentando os bordéis da cidade, aprovou um estatuto que dizia em um de seus artigos: E que tenha uma porta por onde todas as pessoas possam entrar. O prostíbulo se tornou o Paço da Mãe Joana, nome que se divulgou em Portugal.

Tirar o Cavalo da Chuva

Ainda é costume, no interior, onde o cavalo é o meio de transporte mais comum, amarrar-se o cavalo na frente da casa. Tirar o cavalo da chuva seria amarrá-lo na varanda ou alguma outra proteção, para que o visitante pudesse demorar-se calmamente. Quando este esboça um gesto de partir, o dono da casa diz logo: - Pode tirar o cavalo da chuva, ou seja, pode desistir dessa pressa de partir. A ampliação de sentido para desistir de alguma coisa, ou simplesmente desistir, é uma consequência do uso muito frequente da expressão.

Chá de Casca de Vaca

Chá é uma infusão que se toma como remédio para combater alguns males. Casca de vaca é o couro com que se fabricam, entre outras coisas, as talas e os chicotes, objetos de suplício de largo emprego. O couro, ou a casca de vaca, passaram a se confundir com a surra ou com o objeto suplício com que a vítima é surrada, respectivamente. Chá de casca de vaca corresponde a surra com chicote de couro. Como o que motiva uma surra é sempre considerado um mal feito, aconselha-se um chá para a cura deste mal. E o chá mais recomendado é feito de couro de boi, ou seja, casca de vaca.

Dizer Cobras e Lagartos.

Acredita-se que cobras, nesta frase feita, é uma forma antiga de coplas; donde dizer cobras significa satirizar ou zombar através de versos de escárnio. A necessidade de fazer a frase redonda fez juntar-se a cobras, já com o sentido obliterado, a palavra lagartos, criando-se uma expressão simétrica, de quatro mais quatro sílabas. Há, no entanto, uma tese de que esta frase já estava determinada na literatura bíblica, não sendo criada arbitrariamente. Cobras e lagartos correspondem ao texto que é do salmo XC: “Sobre a áspide e basilisco andarás”, onde áspide e basilisco correspondem a cobras e lagartos.

Dar uma Colher de Chá

O chá é dado aos doentes, como remédio, mas não apenas uma colher. Uma colher de chá seria insuficiente para curar qualquer tipo de doença. Mas não deixa de ser uma pequena oportunidade, a partir da qual se poderá avaliar a conveniência ou não em prosseguir com a ajuda. Quem aproveita uma colher de chá poderá receber mais ajuda. Mas há quem não dá colher de chá a ninguém. E, não dar uma colher de chá, quase sempre é considerado um ato mesquinho.

Meter a Colher

Meter a colher; meter a colher de pau; meter a colher enferrujada; meter o bedelho; meter o nariz; meter a catana, são variantes da mesma expressão. Naquelas em que entra a palavra colher não há dúvidas de que a origem está na cozinha. Certamente, isto aconteceu quando alguém, assumindo a responsabilidade da execução de um prato, não quis ceder às opiniões ou interferência de outra pessoa. Os determinantes de pau ou enferrujada têm a pretensão de desprestigiar as opiniões emitidas, os palpites dados.

Fechar-se em Copas

O fato de copas estar no plural é um ponto importante a favor da hipótese de se referir a algum tipo de jogo de cartas. Só não sabemos se seria seguro afirmar que tipo de jogo de cartas que lhe deu origem. Significa guardar um segredo. Um jogo de cartas em que os naipes de copas são muito importantes para o resultado final do jogo.

Ir pras Cucuias

Cucuias é o nome de algum lugar, se não real, ao menos imaginário. Provavelmente, uma região inóspita. O nome, sem dúvida, é de origem indígena. Um lugar onde o medo e a dor predominam. Aí devem ser as Cucuias. Um lugar imaginário. Neste caso a expressão corresponde a ir para os infernos ou ir para as profundezas dos infernos.

Ficar Cheio de Dedos

Vejamos: Ficar cheio de dedos, cheio de chove-não-molha; cheio de frescura; cheio de história; cheio de ípsilones; cheio de merda; cheio de nove horas; cheio de si; cheio de vento; etc. Dedos, além de instrumentos de trabalho, são os principais instrumentos de defesa do ser humano. O medo ou o susto são capazes de nos fazer armar psicologicamente de muito mais dedos do que os que possuímos, como um caranguejo acuado. Ficar cheio de dedos é uma descrição desse nosso estado de espírito que assim se arma quando nos sentimos ameaçados ou constrangidos. Não é por acaso que as pessoas, quando se sentem nervosas, movimentam os dedos descontroladamente, como se estes estivessem maiores que o normal ou como se houvesse alguns dedos em excesso.

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