Ilusões
Vendo ilusões.
Ilusões que se esvaecem em espirais, à medida que são consumidas, mas propiciam a paz tranquilizadora de corações sem rancores. Mais ainda. Possibilitam o sossego cordial, de quem viu invernos tropicais, viveu verões meridionais e atravessou suas tempestades.
Asseguram a paz, de não ter que se preocupar com carro estranho e muito próximo, em um cair de noite. Garantem o sossego de poder aproveitar, gostosamente, os instantes das paradas obrigatórias ao sinal vermelho dos semáforos.
Abonam o despreocupado sossego, das ruas desertas, percorridas a pé altas horas da madrugada. Momentos ideais, para ilusões desvanecidas em fumaça. Certificam o estar prazeroso das casas antigas, debruçadas sobre as calçadas, com suas portas e janelas sempre abertas para o mundo.
Afiançam a paz em poder socorrer um corpo estendido ao chão, sem o desassossego de pensar nele possam estar ocultos, impensáveis propósitos.
Vendo ilusões.
Ilusões que, enquanto fumegam, permitem entender as razões incompreensíveis das grades de presídios estarem em nossas casas. Das cercas eletrificadas para gentes quando, a rigor, foram pensadas para confinar animais, em pastos. Dos mil vigias, vigiando-se uns aos outros. Das senhas e das contrassenhas. Das írises e das digitais.
Vendo ilusões.
Ilusões que dissipam nossas cotidianas aflições. Aflições por não podermos abrir anexos de e-mails, sob risco de danificar nossos computadores. Por não podermos, tranquilamente, parar o carro à porta da garagem e abri-la sem sustos e sem temores.
Vendo charutos.
Vendo ilusões.
Hugo A. de Bittencourt Carvalho, economista, cronista, ex-diretor das fábricas de charutos Menendez & Amerino, Suerdieck e Pimentel, vive em São Gonçalo dos Campos – BA.
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