Caguto
Caguto é a simpatia em pessoa. “Bon vivant”, alegre e amigo de todo mundo. Sua única preocupação é quando quebra a corda do violão. É o tipo do cara que desde o dia que nasceu já entrou em férias. “Quem? Eu, me preocupar”? – diz sempre. Tendo um violão à mão, uma garrafa de pinga da boa e uma mulher bonita ao lado, tudo mais se ajeita. Afora estas três coisas citadas, a sua maior paixão é a pesca. Falou que tem pescaria, não importa a distância ou o dia, ele está lá.
Certa vez, em época de Natal, ele viajou com o amigo Mané Kaçola pra uma pescaria numa vila de pescadores do recôncavo. O lugar era tão isolado que nem carro entrava. Um verdadeiro paraíso. Por lá eles ficaram no Natal e Reveillon, comendo, bebendo, tocando violão, dormindo e... pescando, que ninguém é de ferro.
Depois da virada do ano, dia 02 de janeiro, Mané Kaçola
voltou pra cidade e passou no Boteco do Vital, onde os amigos comuns se reuniam
nos finais de tardes. A turma logo quis saber como é que foi a viagem. Ele
contou que foi tudo uma maravilha, que tinha muito peixe e pinga da boa, que o
lugar era um paraíso e tudo o mais. Aí alguém resolveu perguntar: “E o Caguto,
não veio?”
“Não ele ainda está por lá. E disse que esse ‘restinho’ de
ano ele não volta mais não”.
Caguto tem uma chácara na beira do lago de Pedra do Cavalo.
Durante o verão ele, praticamente, mora lá. Só sai pra visitar os amigos. Um
dia ele me disse, animado: “Comprei um banco”. (!!) Ante a minha perplexidade,
ele explicou que se tratava de um banquinho de madeira, destes que se usa para
sentar. Eu questionei: E daí? “Daí que,
às vezes, lá na chácara, me dá uma vontade danada de trabalhar. Aí eu pego o
banquinho, sento, me ponho de frente pro lago, e fico lá olhando, quietinho, esperando
a vontade passar”.
E assim Caguto vai levando a vida. Certo dia, no boteco, num
final de tarde, ele estava lá, em pé na beira do balcão, saboreando uma
“envelhecida”, com tira-gosto de caju, quando dois sujeitos começaram a
discutir política em voz alta. Caguto estava de costas pros caras e nem deu
atenção, que esse negócio de discussão não é com ele, mas ouvia a conversa.
A certa altura, um dos sujeitos, oposicionista que
praguejava contra o governo, resolveu matar a questão:
- Olha rapaz, você quer saber o que é que eu quero mesmo? Eu
quero é que esse País acabe...
Foi demais pra Caguto. Ele arregalou os olhos, virou-se
rapidamente e gritou pro sujeito:
- Faça isso não, desgraçado! Onde é que eu vou pescar?
NE: Publicada no livro A Levada da Égua e Outras Histórias (2003)
3 comentários:
Se começar a contar histórias de Caguto agente passa o dia todo e não acaba kkkk
As histórias de Caguto dá pra fazer um livro.
Tô aguardando os próximos capítulos.
Abraços.
Postar um comentário