domingo, 20 de setembro de 2020

Tamanho é documento ou não?

Há quem diga, ou até mesmo acredite que tamanho é tudo. Que a pessoa muito alta, leva vantagem em qualquer circunstância. Pode ser que hoje seja assim, mas naquele tempo... Não no tempo bíblico, mas lá no início da década de 60 - que para muitos equivale à época de Cristo, homem alto mesmo em Feira era Ligosa. Com seu 1.90m de altura, ele chamava atenção por onde passava, até porque tinha um serviço de alto falante e isso o fazia mais alto ainda!

Então apareceu Jô para jogar pelada no campo dos casados, recém-aberto por tratores e homens, onde hoje opera a estação rodoviária. Quase vira uma tragédia, grande, mas grande mesmo para os padrões da época, ele era uma “avis rara”, correspondente a um elefante em meio a uma manada de corças.  Com “apenas” 2 metros e 4 centímetros de altura, descalço, ele assustava a rapaziada com altura média de  1.58m a 1.75m. Às vezes aparecia um mais alto e antes mesmo de ser apresentado, era batizado como nomes simpáticos como:  “galalau”, “comprido sem roda”, “ vara de tirar caju” “espanador do céu”, e outros, igualmente belos, e já perdidos no “transcurso dos séculos”.

Quando aquele gigante vestido com um calção preto, com listras verticais brancas (Botafogo) que era o modelo da época, perguntou “tem lugar pra mim?” alguns craques desistiram da esperada pelada. Mesmo assim a bola rolou e muita gente parou para olhar aquele “adulto jogando bola no meio de crianças do jardim de infância”. Mas a surpresa maior e agradável,  foi-se constatar que aquele gigante tinha o coração  maior ainda do que o seu corpanzil!

Gentil, educado, evitando trombar com os “nanicos”, tornou-se efetivo nos babas da tarde e dava a impressão que estava tudo bem com ele. Mas não era assim. Os sapatos e as roupas eram feitos por encomenda. A cama, colossal, parecia feita para um mamute, tudo era assim. Pior, no entanto, era se relacionar com alguém do sexo oposto. Só tinha colegas de 1.55 a 1.70, as mais altas. Até que foi a um jogo de basquete no FTC e se encantou com uma “gigantesca” morena de 1.85 m, mesmo assim ”baixinha” para os seus 2.4m descalço. Mas o pior de tudo estava para vir. Com 17 anos, resolveu que queria um carro. O cunhado tinha um fusca azul “coisa de cinema” como se dizia. O negócio agora era aprender a pilotar, mas o cunhado se encarregou de ensinar.

Primeiro dia de aula, no campo dos casados, com grande expectativa e um bom público, até porque ele não havia feito segredo sobre a novidade.  Jô tenta se meter no fusquinha que só conhecia seu “dono” de 1.70 m de altura. Uma luta: sobrava perna, braço e cabeção que logo atingiu o teto do azulzinho fazendo duas mossas! Uma no teto, outra na cabeça de Jô. Mas se entrar no carro foi difícil, pior foi sair. Suando muito, pois era bem forte, Jô lamentou ser tão grande e sentenciou quase chorando: “se houver realmente outra encarnação, eu quero ser baixinho!”.  Quem sabe se ele não já alcançou essa graça, e “reencadernou”, como dizia o filosofo Edson Fialho, e circula por ai, feliz, em um fusquinha?

 

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