domingo, 13 de setembro de 2020

Uma estranha viagem a São Paulo

Maciste era pouco pra ele. Não que fosse alto e forte como seu herói, mas era a cara de Kirk Douglas, e até o furo no queixo tinha! Quando ia ao Cine Iris então, voltava daquele jeito. Enchia o peito de ar, contraia o estomago e como era esbelto, parecia mais forte e valente, como queria ser. Mas quando começava a conversar com os amigos da rua onde morava, esquecia que era Kirk Douglas, soltava o ar do tórax e voltava a ser o pacato cidadão da Paraíba, na época terra da peixeira e de matadores.

Na verdade, como toda a família, era de trabalho, paz e brincadeiras. E assim ia seguindo a vida no início dos anos 60 para aquele pequeno grupo de jovens, do qual fazia parte o saudoso Cordeiro, de excelente índole, mas destemido, capaz de enfrentar qualquer parada, como provou várias vezes.

Na época o sonho de muitos era conhecer São Paulo, que parecia algo inacessível, devido a  distância e os meios de transporte de então. Por qualquer motivo, aborrecimento com a irmã, algo assim, Cordeiro anunciou: “vou-me embora para São Paulo”. A notícia rolou, deixando a família  preocupada, pois conhecia bem o seu temperamento. Dia seguinte ninguém viu Cordeiro e Lourinho, mas todos acreditavam que eles estivessem na casa de algum amigo, parente, coisa assim. Dois dias se foram. No terceiro, Geraldo, que também era do grupo de amigos, disse ter visto Lourinho de longe, todo esquivo.

No quarto dia, depois de “buscas intensivas”, Cordeiro foi localizado em uma venda “fora da sua jurisdição”, no antigo Ponto Central. Fazia compras de mantimentos: pão de sal, sardinhas, quitute e refrigerantes. Acossado pelo amigo, ou acochado como preferem os nordestinos, confessou: nada de São Paulo. Há quatro dias residiam em um  apartamento no ‘‘luxuoso” tanque de água do Instituto de Educação Gastão Guimarães (IEGG),  que ainda existe, depois de uma “querela”, com os antigos moradores: um bando de morcegos que ameaçou recorrer da decisão!

Mas usando o regime de força, apoiados em um “remédio jurídico”, uma velha vassoura, em fase de desintegração, a sentença foi mantida pelos dois novos inquilinos. Com a descoberta ficou definido que o segredo seria mantido por alguns dias, como foi. Mas a tão esperada visita ao apartamento não ocorreu. Ninguém teve coragem de visitar a “bela morada”, no terceiro pavimento do “Edifício Tanque de Água do IEGG”. O motivo foi a reclamada inexistência de um elevador! E por falta de visitas, a  não ser dos antigos inquilinos - os morcegos -, que conseguiram ‘reintegração de posse’, Cordeiro e Lourinho voltaram de São Paulo, no quinto dia, para a felicidade geral da nação!  

 

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