sábado, 18 de junho de 2022

 


* Se eu soubesse *


Na vida há hora para tudo e tudo o é na medida certa.

Nada adianta blaterar, praguejar, espernear, reclamar, falar mal, chorar, ante as adversidades e vicissitudes do viver. O certo é tomar conhecimento, dia mais, dia menos, em nossos relacionamentos, poderemos ser assaltados por imprevisíveis circunstâncias, motivadoras da sensação de beco sem saída.

 

Pura ilusão.

 

Há sempre uma área de escape, se não for física, poderá ser engenhosa. A mais eficiente e estratégica das saídas será, sempre, pedir-se perdão. É claro, isto não ser coisa fácil. Tal gesto, implica reconhecer nossos erros ou desvarios: por ações ou omissões.

 

Em verdade, depois de conseguirmos superar o estágio do respeito humano e pedir perdão, quem nos mira, passa a ver-nos com outros olhos. É algo quase mágico. A partir de então, as aflições atenuam-se, evaporam-se, sublimam-se. Convertem-se em desaflições.

 

Lembro bem.

 

Certa feita, como era hábito, fui visitar minha segunda ex-mulher. Era ela, então, casada com simpático argentino, agora defunto, a mim afeiçoado por nutrirmos comuns pontos de vista. Estávamos à casa da qual eu abrira mão, quando de nossa separação amigável. Como nunca nos inimizamos, sempre mantivemos espaço a diálogos confessionais.

 

Sentados à sala de visitas, quase formais, comentei desejar pô-la a par de fato acontecido durante nossa vivência conjugal.

 

Respondeu-me – de súbito –, partido de mim nada a surpreenderia. Senti-me à vontade e também de chofre, informei-lhe que, fruto de relação extraconjugal, aos 40 anos, eu houvera sido pai de uma menina, sendo a dita, portanto, da mesma idade de nosso último filho.

 

Ela, em postura soberana, sem denotar qualquer emoção, ao invés de - como seria compreensível – valer-se do momento para trazer à tona eventuais ressentimentos, amigavelmente, aconselhou-me a logo apresentar a menina a seu irmão contemporâneo. Completou, afirmando: “Você sabe, vivemos em um mundo muito pequeno, sendo melhor informar antes, depois poderá ser tarde demais”.

 

O desdobramento de tal providência representou agradável e inesquecível acontecimento, fotograficamente documentado, quem sabe para registrar em outra oportunidade.

 

Para encerrar, vale recordar: ao nos despedirmos, fitando meus olhos, ela comentou algo luzindo a uma declaração de amor extemporânea, mas agora ao escrever estas linhas, transcorridos incontáveis anos, concluo ter sido, simples reflexo de sua maturidade. Disse-me ela. “Se eu soubesse você iria mudar tanto, teria tido mais paciência com você!”

 

Ponto final.

Se eu soubesse o que ora sei, não sei se agora estaria onde estou.

 

Hugo A. de Bittencourt Carvalho, economista, cronista, ex-diretor das fábricas de charutos Menendez & Amerino, Suerdieck e Pimentel, vive em São Gonçalo dos Campos – BA.

 ([email protected])

Um comentário:

Dina Lopes disse...

Muitas vezes é melhor calar-se ou tentar entender que se opor ao que não esperava-se receber.