Com
a crise econômica, o dólar em alta e a inflação batendo recordes, a
pressão popular sobre Dilma tem se intensificado. No último domingo,
durante o
primeiro pronunciamento da presidente em rede nacional neste ano, um
'panelaço' foi registrado em várias capitais, com moradores saindo em
suas janelas para gritar palavras de ordem contra a petista. Além disso,
há um grande protesto sendo convocado nacionalmente para o próximo dia
15 de março que deve pedir a saída da presidente do cargo.
Mas existe base para sustentar um pedido de impeachment?
A
BBC Brasil conversou sobre o assunto com alguns dos mais renomados
juristas do país, que fazem análises distintas sobre a possibilidade de
um eventual afastamento da presidente do cargo. Confira:
Existe base jurídica para um pedido de impeachment de Dilma?
No início de fevereiro, o jurista e professor emérito da Universidade Mackenzie Ives Gandra Martins divulgou no jornal Folha de S. Paulo
um trecho do parecer jurídico que escreveu a respeito de um possível
impeachment de Dilma Rousseff. Nele, Martins conclui que há
fundamentação jurídica para um processo como esse, baseando-se na
hipótese de culpa da presidente diante dos escândalos que têm sido
revelados envolvendo desvios de dinheiro público na Petrobras.
"O
que é culpa? Imperícia, negligência, imprudência ou omissão. Dilma foi
presidente do Conselho Administrativo da Petrobras e não diagnosticou os
erros no contrato (da refinaria) de Pasadena. Ela manteve a direção da
empresa, sendo que a empresa foi saqueada durante oito anos, e ela
permitiu isso primeiro como presidente do Conselho, depois como ministra
das Minas e Energia, por último como presidente", disse o jurista à BBC
Brasil. "É um caso de culpa, que pode ser considerado no crime de
improbidade administrativa e, portanto, tem base jurídica."
Para o
jurista e professor de Direito Administrativo da PUC-SP Celso Antônio
Bandeira de Mello, porém, não há nada que evidencie a relação de Dilma
com os escândalos da Petrobras. "Precisaria ser algo muito mais forte,
que vinculasse muito diretamente a presidente à prática criminosa. Nesse
caso, não há fatos", afirmou. "Não tem nenhum sentido falar nisso. Se
for assim, todos os presidentes do mundo podem sofrer impeachment,
nenhum iria escapar. Isso não passa de esperneio político, eles querem
ganhar a eleição no tapetão."
Martins rebate: "Se eu sou
diretor de uma empresa, essa empresa é saqueada por oito anos, em
bilhões de reais, será que ninguém percebeu? Então, ela deixou que a
empresa fosse saqueada."
Mas na visão Bandeira de Mello, a
articulação pelo impeachment é uma tentativa de 'golpe' contra o
resultado da eleição. "Isso não tem sentido. A direita ficou irritada
por ter perdido a eleição e acha que podem criar essa 'onda'. Eles estão
junto com a imprensa em uma campanha forte pra desestabilizar o governo
da Dilma. Existe um costume no Brasil de chamar de opinião pública o
que é opinião publicada", opinou.
O impeachment é uma decisão jurídica ou política?
Os
dois juristas entendem que, apesar da discussão sobre as leis em torno
do tema, um impeachment depende muito mais de uma vontade política do
que de um embasamento jurídico. "É uma decisão muito mais política do
que jurídica. Até deveria ser mais jurídica do que política, mas não é. É
o Legislativo que decide e seria preciso que o Legislativo estivesse
muito fanatizado para isso acontecer. Não e fácil contrariar a vontade
do povo nas ruas", disse Bandeira de Mello.
Ele
explica que, para que um presidente seja afastado de suas funções, o
processo de impeachment precisa ser aprovado primeiro na Câmara por dois
terços dos deputados, e depois no Senado, pela mesma proporção. Por
conta disso, Ives Gandra Martins também concorda que a discussão é muito
mais política do que jurídica. "O argumento jurídico é para dar base à
discussão. Pode-se discutir juridicamente, mas se a Câmara afastar o
presidente, dificilmente o STF (Supremo Tribunal Federal) iria contestar
uma decisão da Câmara."
O especialista em Direito
Constitucional Pedro Serrano afirma, porém, que, apesar de o Legislativo
ter o poder de 'julgar' um processo de impeachment, esse julgamento não
é puramente político, porque precisa ser feito sob critérios legais. "O
Congresso não pode inventar um processo de impeachment, isso seria uma
forma de golpe. Ele só pode julgar um processo desses nas hipóteses
previstas na lei. A pessoa que decide é o Congresso, mas ele decide a
partir de um processo legítimo", explicou.
"Se ela fosse cassada
por esses motivos (mencionados por Gandra), ela (Dilma) poderia recorrer
ao Judiciário alegando que argumentos não são fundamentáveis
juridicamente. E aí ela pode conseguir uma liminar que suspende a
decisão do Congresso, porque a decisão em última instância é sempre do
STF. O Congresso julga de acordo com as leis e não de acordo com a
vontade dele."
No atual cenário, qual é a probabilidade de existir um impeachment?
Apesar
de ter escrito um parecer jurídico que dá base a um eventual
impeachment da presidente Dilma, o jurista Ives Gandra Martins entende
que essa é uma hipótese que dificilmente se concretizará no atual
cenário. "Eu tenho a impressão que, juridicamente tem base, mas
dificilmente um presidente não tem um terço do Congresso do seu lado",
explica. "Acho que a única probabilidade de isso acontecer é a
manifestação do dia 15 ser de tal ordem que faça com que os deputados
percebam que é ruim para eles ficar do lado dela, porque 'pega mal'
ficar do lado de uma pessoa que é tão criticada. Mas politicamente é
improvável."
Lembrando a única situação de impeachment vivida no
país - quando Fernando Collor de Melo foi afastado do cargo por
denúncias de corrupção, em 1992 -, o jurista Celso Antônio Bandeira de
Mello reitera que seria muito difícil a situação se repetir agora. "O
impeachment só acontece nos casos que são chamados 'crimes de
responsabilidade'. Isso é uma coisa rara e difícil de acontecer, tanto
que na história do Brasil, só houve o caso do Collor - mas ele também
passou dos limites", afirmou.(BBCBrasil)
Nenhum comentário:
Postar um comentário