*Arte de Dizer*
Entre outras coisas,
falar sobre sopas, sopros
e lágrimas.
Quando me expresso,
não aspiro parecer com
terceiros,
embora em muitos me
inspire.
Todavia, por mais
esforço faça em ser inédito,
despenco sempre, no
lugar comum das palavras vãs.
Meu intento é
inalcançável.
Apesar disso,
insistente e despeitado,
abandono-me aos maus
tratos da memória,
malgrado a mesma ser
incapaz
de grandes feitos com
poucas palavras.
Sei não viver nas
nuvens.
Aprecio-as à distância.
Mas, gostaria de
reconhecer-me em algo
nunca escrito, nunca
dito, nunca lido nem vivido.
Gostaria de ser
surpreendido e surpreender,
cartas à mesa sobre o
verde pano das apostas,
em jogo sem coringas
no qual todos sejam
vencedores.
Ouvintes e prosadores,
comensais e
escritores,
cozinheiros de
palavras.
Por isso e para isso, vinculei-me
ao inovador e poético coletivo
de escritores e
escritoras são-gonçalenses.
Jogo sem trampa, sem
escamoteio nem blefes.
Gente ligada às palavras
que, ao ordenar letras,
soletra no
tabuleiro-vida pensares
a exigir atenção à
movimentação das pedras do xadrez.
Aquela torre imóvel,
postada a um dos
cantos do tabuleiro,
visível ameaça de um
xeque-mate,
é porta a ser trancada
para evitar-se o golpe final
e, assim, prossiga o
jogo, em redobrado prazer.
Horas em giro,
caneta em traços,
texto encerrado,
tabuleiro guardado,
mesa arrumada,
sopa fervente,
pratos servidos.
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Agora é tempo do
ranger das rodas da literatura,
carreta a ser
tracionada por nós mesmos.
O combustível?
Boas prosas... Inspiradas poesias...
Tal qual, em noites de
conversas reveladoras,
embalados na
malemolência de prazeres nutridos por nossas lembranças.
Recordações insufladas
pelos benfazejos sopros,
saídos de bocas velhas
de nossos antepassados.
Falei de sopros?
Ah! A magia dos sopros!
Fantasia presente em nossas vidas.
O sopro da mãe no
dodói da criancinha.
Vai passar! Vai
passar!
O sopro do pajé,
suspirando a Tupã
sucesso no próximo
combate.
O sopro da vida dada
ao homem-barro,
como reza a lenda.
O sopro suspirado,
ao ouvido de alguém,
pondo ordem às letras
E, U, T, E, A, M, O.
O sopro em lágrimas
abafado,
por não haver vivido
os derradeiros dias de
meus pais.
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Falei de lágrimas?
Ah! A magia das lágrimas!
Penso que isto prenda-se
o fato
de os homens terem
na poesia
a fórmula mágica,
oriunda da força das
palavras,
para acobertar seu
racionalismo
e, vezes muitas,
para externar emoções
embargadas na garganta,
a camuflar arredias
lágrimas.
Homem não chora!
diziam os mais velhos.
Ledo engano.
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É saudável e
enriquecedor desfrutar da companhia de vocês,
Confrades e confreiras,
que com letras e
palavras proporcionam
o sustento das sopas,
o ânimo dos sopros
e o consolo das
lágrimas.
Desejo que nossa
convivência frutifique
e arremedo Mário de
Andrade,
“quero cercar-me de pessoas
que saibam tocar no coração das pessoas”.
Despedindo-me,
em tempos de
mascarados sem ser carnaval,
encareço relevarem se,
porventura,
minhas palavras tenham
chegado úmidas até vocês.
Elas secam!
Hugo Bittencourt,
cronista,
vive em São Gonçalo dos Campos – BA
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