segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

Crônica de segunda

         O Clube dos Sete

        Na década de 60 a Micareta de Feira de Santana ainda não era essa coisa mercantilizada, violenta e distorcida que é hoje. Naquela época, grupos de amigos fundavam agremiações, confeccionavam fantasias e, com suas namoradas, desfilavam pelo sítio na festa com alegria e sem medo. Foi nesse clima que surgiu o Clube dos Sete, formado por Zé do Ó, Renovato, Airton Cabrunco, Luizito Cegonha, Carlinhos de Coló, Ivo Moreira e Tonheiro. Tinha ainda como convidados especiais Amélio Amorim, Fred Valverde, Guga Oliveira, Armando (Pintão) Curvelo e Luciano Vital, entre outros.

        Essa turma costumava passar o carnaval em Ilhéus. Já conheciam muita gente por lá, o dono do hotel já era amigo deles e, Ilhéus, apesar da fama de pouco hospitaleira com “gente de fora”, recebia bem os jovens feirenses.

        Um dia, num baile de carnaval, Pintão perguntou a Zé do Ó: “O que é que esse playboys de Ilhéus estão querendo, que toda hora me pedem “uma coisa”? Zé do Ó, que era o gênio inventivo e investigativo do grupo, investigou e descobriu. Os jovens ilheenses achavam que os feirenses tinham “bolinha”, um comprimido estimulante cujos usuários seriam, nos dias de hoje, comparados a drogados. E não era o caso daquela turma.

        Ferido em seus brios, Zé do Ó resolveu “aprontar”. Saiu do clube e, pouco depois, voltou com os bolsos cheios de comprimidos, que distribuiu com a turma dizendo: “Pode distribuir a vontade”. O sujeito tomava a suposta “bolinha” e saia “ligadão”.

        No dia seguinte, o dono do hotel acordou todo mundo cedinho e, preocupado, disse: “Vocês aprontaram alguma coisa, e só não apanharam ainda porque os palyboys de Ilhéus ainda não conseguiram reunir um grupo pra enfrentar vocês. Chegam a juntar dois ou três, mas quando outros estão chegando, os primeiros voltam pra casa. Te todo mundo de diarréia.” É que Zé do Ó tinha comprado todo o estoque de purgativos de uma farmácia, e distribuído dizendo que era “bolinha”.

        Mas pior que isso ele aprontou no Feira Tênis Clube, na época em que era presidente do “Aristocrático”, Péricles Valadares. O Clube dos Sete trouxe para a Micareta de Feira de Santana, algumas estudantes de Salvador. O presidente do clube cismou de que eram prostitutas e não queria permitir a presença delas no “Aristocrático”. Depois de muita argumentação, permitiu que ficassem, mas sob a condição de permanecerem sentadas à mesa, sem dançar.

        Mais uma vez, prevaleceu o gênio criativo de Zé do Ó. No dia seguinte, o escândalo estava nas ruas. Pais de família revoltados e a seriedade e decência do clube em xeque. Zé do Ó então tripudiou: “E então, presidente. É esse o clube em que nossas amigas, estudantes e filhas de boas famílias soteropolitanas, não podem entrar”? O presidente pediu pelo amor de Deus que ele não falasse mais no assunto, e que as meninas podiam entrar e dançar no clube a hora que quisessem. Ele tinha coisas mais sérias com o que se preocupar. Por exemplo: Descobrir o que aconteceu, que o clube, decente e aristocrático, havia amanhecido cheio de “camisinhas” usadas. Tinha camisinha no jardim, no salão de dança, nos banheiros  e até na sala da diretoria. 

NE: Publicada no livro A Levada da Égua  - 2004

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