segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

Crônica de Segunda


Benzinho e Amorzinho

         O município de Riachão do Jacuípe, localizado na região sisaleira, há cerca de 80 quilômetros de Feira de Santana, foi por muito tempo conhecido pela quantidade de “rapazes alegres” que produzia. Diz a lenda que tudo se deve a uma árvore, conhecida popularmente como “Barriguda”, plantada numa das principais praças da cidade. Ali, segundo contam, se reuniam os jovens para conversar e, ainda segundo a lenda, quem permanecesse por muito tempo sentado sob a tal Barriguda, sofria alterações hormonais. Isto é: homem começava a ficar parecido com mulher e vice-versa. O fato é que por muitos anos a cidade era vista como o “Paraíso Gay”.

        Moravam em Riachão dois senhores, amigos inseparáveis, respeitados pais de família, que de gay não tinham nada, mas cujos apelidos poderiam sugerir muitas coisas a quem não os conhecesse de perto. Como em toda cidade interiorana, é comum botar-se apelidos, este caso não foi exceção, apelidados que foram como “Benzinho” e “Amorzinho”.

        Um incauto caixeiro viajante, que se encontrava pela primeira vez trabalhando naquela “praça”, andava todo desconfiado, pois já conhecia a fama do lugar. Durante a lida do dia, ele não viu nada de extraordinário, mas foi à noite, na hora em que os bichos (?) saem da toca para caçar, que a coisa aconteceu.

        Cansado de um intenso dia de trabalho, o viajante resolveu esticar as pernas na praça, onde havia muitos bares e uma brisa gostosa se vazia sentir, contrapondo ao calor infernal do dia, o que é muito comum nestes sertões.

        Sentado à mesa de um bar, o viajante bebericava sua cervejota e se espantava com a quantidade da fauna que via desfilar na rua. Esquivando-se meio sem jeito de olhares furtivos da bicharada, o viajante ruminava seus pensamentos, sem querer acreditar no que via:

        - Vá ter bicha assim no raio que o parta...

         Estava ele imerso nestes pensamentos, sem saber que no mesmo bar, numa mesa vizinha a sua, conversavam animadamente, numa roda de amigos, os dois personagens principais desta história. Lá para as tantas da noite, um deles resolveu se despedir. Levantou-se da mesa e falou com o amigo:

- Benzinho, eu já vou embora.

- Tá bem Amorzinho, amanhã então a gente torna a se ver...

        Foi demais pro viajante. Ele se levantou e passou uma descompostura nos perplexos cidadãos que não entenderam nada:

        - Onde já se viu, até dois velhos barbados, de cabelos brancos, que deveriam se dar ao respeito... assim também já é demais, ora bolas...

NE: Publicada no livro A Levada Egua.

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